Homilia do Padre Françoá Costa – XV Domingo do Tempo Comum – Ano A
Parábolas do cotidiano
Vamos aproveitar as passagens bíblicas que a liturgia nos oferecerá nos próximos três domingos para refletir sobre a importância da formação. Neste domingo, procurando entender porque Jesus explicava as coisas em parábolas, tiraremos algumas consequências. No próximo, veremos que um cristão bem formado é condição de eficácia no meio do mundo. Finalmente, veremos a importância de um conhecimento que, ademais de ser fruto do estudo, é também fruto da instrução do Espírito Santo.
O que é uma parábola? É aquilo que chamávamos antes de “estória”, ou seja, uma historinha inventada da qual se podem deduzir diversas verdades importantes. Jesus contava muitas estórias. Era uma maneira pedagógica de explicar-se aos seus ouvintes. As parábolas de Jesus não são difíceis. No entanto, quando se lê que era concedido aos Apóstolos conhecer os mistérios do Reino, mas aos demais não ou quando se observa que Jesus se dirigia ao povo com parábolas, dá a impressão que ele não quer que as multidões entendam a sua mensagem. Até parece que a doutrina de Jesus é para um grupinho selecionado e formado por alguns privilegiados. E não é assim.
Ora, concedamos que, diante da dureza de coração do povo, Jesus, pedagogicamente, cite o profeta Isaias e se lamente de que ainda que fale em parábolas o povo parece encontrar-se tão torpe para as coisas do Espírito que não entende as realidades do Reino. E, no entanto, as parábolas eram altamente instrutivas, fáceis de captar e muito oportunas no contexto: “Tudo isso disse Jesus à multidão em forma de parábola. De outro modo não lhe falava, para que se cumprisse a profecia: Abrirei a boca para ensinar em parábolas; revelarei coisas ocultas desde a criação do mundo” (Mt 13, 34-35). Portanto, as parábolas são reveladoras de realidades arcanas, escondidas. Jesus as utiliza porque sabe que são muito importantes para levar o povo, paulatinamente, a adentrar nas realidades do Reino de Deus.
A parábola de hoje é maravilhosa: o semeador. Jesus é o semeador que lança em terra a semente, isto é, a palavra de Deus. Ele a semeia por todas as partes, em todos os campos, porque a salvação é para todos. Todos devem ter acesso à felicidade eterna. No entanto, os terrenos são diversos. Alguns estão muito expostos, estão à beira do caminho; outros não têm profundidade, trata-se duma terra pedregosa na qual as raízes não podem estender-se. Mas nem tudo está perdido, também há terra boa. Isso não significa que as sementes que caíram à beira do caminho ou em solo pedregoso não possam produzir frutos. O terreno seria relativamente indiferente quando preparado para a plantação. O importante é trabalhar bem o terreno, mais ainda quando hoje em dia há técnicas agrônomas eficazmente comprovadas. Aí está a missão do cristão: preparar o terreno, ser terra boa e fazer de tudo para que os outros terrenos recebam a Palavra de Deus com generosidade.
Jesus fala com uma linguagem acessível aos seus ouvintes. Há algum tempo, procurando entrar na pedagogia do Divino Mestre, utilizo historinhas nas minhas pregações para facilitar que se capte a mensagem do Senhor. É preciso que falemos aos demais das coisas do Reino de uma maneira cada vez mais inteligível. Talvez não o façamos porque nem nós mesmos entendemos aquilo que gostaríamos de transmitir. Daí a importância do estudo, da formação contínua, das boas leituras. O cristão tem que ter muito cuidado para não ser um “bicho raro”: sabe muito sobre a ciência humana na qual trabalha (física, química, matemática, etc.), mas não sabe nada ou quase nada da ciência de Deus; sabe muito do mundo, mas não do Criador do mundo; pensa saber muito sobre a liberdade, mas sem entender verdadeiramente o que significa o respeito à liberdade dos seus irmãos.
A nova evangelização dependerá muito dessa capacidade de transmissão que tenhamos. Por outro lado, não se pode pensar que isso é simplesmente um dom que se tem ou não se tem. Cada cristão deve ser evangelizador e por isso deve procurar, segundo a sua capacidade, crescer no conhecimento da doutrina cristã, ter uma verdadeira empatia – uma capacidade de identificar-se – com as coisas de Deus e com as coisas dos homens, seus irmãos. Nesse contexto, a amizade é muito importante para que seja possível compreender os próprios amigos e ajudá-los falando “a mesma língua” que eles. Quando se conhece bem a uma pessoa através da amizade, se lhe poderá falar de Deus através daquelas realidades humanas nas quais se encontra mais inserida.
A nova evangelização é tarefa de todos. No entanto, hoje eu gostaria de destacar a função dos leigos. Deus tem um campo, um terreno enorme, e ele pede que muitos homens e mulheres realizem a sua vocação cristã no campo do trabalho profissional, da família, das diversões, da amizade. Nestes campos terão que lançar a semente, falar com simplicidade e de maneira compreensível, utilizar as diversas parábolas que tenham base no cotidiano dos demais. Deus lhes ajudará a colher abundantes frutos em todos os ambientes nos quais devem viver lado a lado com os demais, implicados em realizar a sociedade atual na qual também Deus tem direito a ter o seu lugar.
Pe. Françoá Costa