“Tu és o Cristo” (Mt 16,16), eis a profissão de fé de Pedro. “Tu és Pedro” (Mt 16,18), eis a demonstração de que Deus confia nos homens. Na clausura do Ano Sacerdotal, o então Papa Bento XVI falava da audácia de Deus, que consiste em confiar nos homens a tal ponto de fazer deles instrumentos e canais da graça. Realmente, Deus confia em nós! Não nos necessita, mas quis necessitar de nós. Todos juntos, bem unidos ao Papa, ganharemos o mundo para Cristo: essa é a santa audácia dos cristãos e, de maneira especial, dos fiéis leigos.
Leigo, na Igreja, não significa “ignorante”. Leigo é o cristão que se santifica em e a partir das realidades terrenas, seculares, civis; faz parte do Povo de Deus e leva a luz de Cristo a todos os ambientes. Na Exortação Apostólica “Christifideles Laici” (nº 17), sobre a vocação e missão dos leigos na Igreja e no mundo, S. João Paulo II parecia contemplar “um cenário maravilhoso que se abre aos olhos iluminados pela fé: o de inúmeros fiéis leigos, homens e mulheres, que, precisamente na vida e nas ocupações do dia a dia, muitas vezes inobservados ou até incompreendidos e ignorados pelos grandes da terra, mas vistos com amor pelo Pai, são obreiros incansáveis que trabalham na vinha do Senhor, artífices humildes e grandes — certamente pelo poder da graça de Deus — do crescimento do Reino de Deus na história”.
Diferente do fiel cristão que foi chamado à vida consagrada (um religioso, por exemplo), o fiel leigo não realiza as diversas atividades como “sinal” ou como “testemunho” do “mundo futuro” que há de vir. Vejamos: o fiel consagrado que se dedica à docência, fá-lo dando testemunho do “mundo futuro”, a sua atividade docente se realiza como sinal das realidades transcendentes que hão de vir. Isto é assim porque o fiel dito “consagrado” recebeu uma posição carismática dentro da vida da Igreja que modalizou os seus vínculos batismais e retocou a sua secularidade; a sua atividade como professor, por exemplo, é testemunho e sinal da santidade da Igreja e da vida escatológica. Ao contrário, um fiel leigo que é professor, realiza essa atividade profissional com um interesse neste mundo, para santificar esta profissão e, consequentemente, este mundo. Hoje é o dia de reconhecermos com gratidão a vocação dos cristãos leigos, da grande maioria do Povo de Deus: obrigado! Vocês levam a luz de Deus aos ambientes profissionais, familiares e de amizade, e vivem a santidade como heroicidade no ordinário, no cotidiano.
Os fiéis leigos devem evangelizar em comunhão com a Igreja, mas a sua atividade evangelizadora não necessita um mandato especial por parte da hierarquia (bispos, padres, diáconos), não necessitam “envio”. Não! Os leigos já foram delegados pelo próprio Senhor no momento do batismo, o sacramento que os fez fieis e missionários do Reino. O apostolado próprio dos leigos é “buscar o reino de Deus, ocupando-se das coisas temporais e ordenando-as segundo Deus” (LG, 31), isto é, viver cristãmente realidades como família, trabalho, amizades, diversões. O Concílio Vaticano II afirmou que “o dever e o direito do apostolado dos leigos deriva da união destes com Cristo cabeça. Com efeito, inseridos no corpo místico de Cristo pelo batismo e robustecidos pela virtude do Espírito Santo na confirmação, os leigos são deputados pelo próprio Senhor para o apostolado” (AA, 3). Outra coisa é quando exercem algum trabalho na paróquia em colaboração com o ministério ordenado dos bispos e padres, nesse caso eles são delegados pela hierarquia, tal é o caso dos ministros extraordinários da comunhão eucarística ou dos catequistas. Contudo, também esses ministros e os catequistas devem ter consciência que o seu primeiro apostolado é a animação cristã das realidades temporais. Seria uma contradição se um vereador se dedicasse intensamente no mistério extraordinário da comunhão eucarística e descuidasse a animação cristã da política. Esse leigo, que é vereador, deve fazer da política um espaço no qual Cristo reine e, por conseguinte, as pessoas sejam valorizadas e o bem comum respeitado. Nesse trabalho, podem contar com o alimento espiritual que a Igreja sempre lhes oferecerá através da Palavra e da Eucaristia.
Sem dúvida, é um capítulo enorme o dos cristãos leigos e leigas: é preciso ter coragem de enfrentá-lo! A Igreja no Brasil ainda está começando a abrir as páginas desse denso capítulo: durante as últimas décadas se falou muito do “leigo engajado” na Igreja, mas se esqueceu que o “engajamento” na Igreja do leigo é no mundo, em e através das realidades profissionais, familiares; caso sobre tempo e eles forem generosos, também poderão colaborar com os padres nas paróquias. Isto é, o trabalho que realizam nas nossas paróquias deve ser fruto da generosidade e não da abstenção de realizar aquilo que é próprio à sua vocação específica! Deus abençoe tudo o que fazem e lhes façam conscientes para que realizem o que lhes é próprio, sem deixarem de serem generosos para com a comunidade paroquial.
Pe. Françoá Costa